MUNDIALVENEZUELA: A luta por um polo independente de Maduro, da direita e do imperialismoPor Milton D’León
Esquerda Diário
11 de Agosto de 2024
Manifestantes saíram às ruas para protestar contra o resultado oficial das eleições, na segunda-feira, no bairro de Catia, em Caracas. Cristian Hernandez (AP/LaPresse)
A Venezuela está vivendo de novo uma crise política de grandes proporções, depois das eleições presidenciais de 28 de julho, quando o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), após longas e inexplicáveis horas, anunciou que Maduro tinha vencido o candidato Edmundo González, que tinha o apoio da direitista María Corina Machado. Estava montado o cenário para o que não podia ser outra coisa senão uma fraude eleitoral. Os olhos do mundo estavam voltados para o que estava acontecendo na Venezuela, com uma crise que ainda não chegou ao fim e ainda não está claro como sair dela, mas todos os cenários, tanto da direita como do governo de Maduro, não são favoráveis para o povo trabalhador, por isso uma alternativa é a necessidade de lutar por um pólo independente de Maduro, da direita e do imperialismo.
Com um sistema automatizado e, se tratando apenas de eleições presidenciais, o atraso foi muito grande. O primeiro boletim oficial, com 80% dos votos contados e irreversíveis, mostrava Maduro com 51,2% dos votos contra 44,2% do candidato da oposição Edmundo González Urrutia. Uma diferença de sete pontos entre Maduro e González, com 20% dos votos ainda por contar, e sem qualquer referência às percentagens dos outros oito candidatos ou à distribuição nacional dos votos. Cinco dias depois do fim do processo, na sexta-feira, 2 de agosto, foi emitido um segundo boletim, onde, com 96,87% dos boletins contados, Maduro atingia 51,95%, enquanto o candidato de María Corina tinha 43,18%.
A forma como foi apresentado o primeiro boletim, a denúncia de um alegado hackeamento da transmissão de dados para prolongar o anúncio, sem conhecimento da ata, revelou sem dúvida um processo viciado e fraudulento. No próprio domingo, foram denunciadas irregularidades na transmissão dos relatórios das atas de votação e a expulsão arbitrária de testemunhas das seções eleitorais. O comando das Forças Armadas validou todo o processo, mesmo antes do anúncio da CNE. Num roteiro semelhante ao de anteriores eleições fraudulentas, como a farsa da "Constituinte" de 2017, o porta-voz do governo, o ministro da Defesa (Vladimir Padrino López) e o CNE falaram todos seguidos e, às pressas, o comitê eleitoral proclamou Maduro como o novo presidente que daria continuidade ao mandato de 2025 a 2030.
Horas mais tarde, o setor de María Corina Machado declarava que "a Venezuela tem um novo presidente e é Edmundo González Urrutia", indicando na sua posse 40% dos relatórios das mesas de voto que davam conta da vitória do candidato com 70% dos votos. Números que, pela forma como foram apresentados, sem qualquer controle independente, tinham pouca credibilidade. No entanto, as manobras montadas pelo Conselho Nacional Eleitoral eram mais do que evidentes.
Era o cume de uma fraude que já vinha sendo construída com um processo eleitoral de proscrição política, intervenção e cassação de partidos e candidatos. Um esquema em que as organizações ou políticos de esquerda foram os mais atingidos, pois foram os únicos que não puderam apresentar candidatos. Em suma, foram marcados por mecanismos perversamente anti-democráticos, antes e durante o próprio processo eleitoral. Uma eleição, e é importante notar, que se realiza num país que está sob cerco imperialista com as sanções econômicas dos Estados Unidos e de outros países europeus que começaram a partir de agosto de 2017, a mais brutal em janeiro de 2019, que agravou ainda mais a crise econômica, e que sofreu grandes confiscos dos seus bens mais importantes no estrangeiro.
O desenrolar da crise e os protestos na Venezuela
Escrevemos semanas antes das próprias eleições que, se o governo de Maduro fosse proclamado vencedor, fosse por uma margem estreita ou grande, e a oposição não reconhecesse os resultados anunciados pela CNE, e se houvesse fraude aberta, abrir-se-ia uma situação convulsiva no país com protestos maciços, em que o governo poderia não só reprimir mas também chamar as suas forças sociais e políticas para as ruas.
O silêncio e a tranquilidade estupefatos que amanheceram na capital e, em geral, na maior parte do país na segunda-feira, 29 de junho, foram quebrados a partir do meio da manhã com manifestações espontâneas que rapidamente se intensificaram e levou a mobilizações e protestos em muitas áreas populares de Caracas que apanharam o governo de Maduro de surpresa. Uma situação a que se juntaram outros setores sociais médios e que se estendeu a várias cidades do país, como resposta à grotesca fraude nas eleições presidenciais. No auge dos protestos desse dia, o Procurador-Geral da República declarou que qualquer movimento que se opusesse ao reconhecimento dos resultados seria investigado e submetido à lei. As forças armadas voltaram a manifestar-se e o governo reprimiu duramente, não só com as forças repressivas da Guarda Nacional Bolivariana, mas também com bandos armados para-policiais.
É importante mencionar que Edmundo González e María Corina tinham declarado à meia-noite de domingo que não estavam a convocar manifestações. É por isso que os protestos de segunda-feira, 29 de junho, foram muito espontâneos e tiveram lugar em locais considerados bastiões do chavismo, como o populoso bairro de Petare, onde os tachos e panelas soaram bem alto, mas também onde a repressão foi mais duramente sentida. Não se podia tolerar que os bairros pobres saíssem à rua para exigir o seu direito a conhecer os resultados concretos, para um governo mais habituado a enfrentar a base social da direita nos seus redutos tradicionais, na zona leste mais próspera da cidade.
A dura repressão é sentida sobretudo nas zonas populares, dada a necessidade de bloquear e reprimir qualquer protesto nestes setores. A violência foi muito maior nestes setores do que noutros. Desde as primeiras horas da manhã de segunda-feira até terça-feira, e durante a manhã, foi montada uma grande contenção policial militar e para-policial para que os acontecimentos de segunda e terça-feira à noite não fossem desencadeados por uma invasão direta das casas pobres. É isso que explica o fato de o que aconteceu a 29 de julho nas zonas populares não se ter manifestado na terça-feira. A partir de quarta-feira, o governo assumiu um maior controle.
A questão de por que a segunda-feira teve sua expressão nos setores populares não é outra senão o enorme cansaço com um governo tão nefasto como o de Maduro e das Forças Armadas, sob o qual houve uma destruição sem precedentes dos direitos trabalhistas e das condições de vida, fazendo sentir seu grande peso nas grandes maiorias trabalhadoras e populares, juntamente com uma repressão sistemática e persistente contra trabalhadores e lutadores sociais. Diante dessa condição, não foi por acaso que a orientação que María Corina Machado deu aos membros da Vente Venezuela (sua organização) e, por essa via, aos demais partidos de sua articulação de direita, foi a de não se envolverem nos protestos de segunda-feira. É por isso que, se considerarmos o processo no seu conjunto, vemos como a partir de terça-feira à tarde tudo começa a se concentrar sob o seu comando, o que se manifesta de forma mais completa na sua convocatória para a manifestação de sábado, 3 de agosto, que já impõe toda a marca da sua política reacionária, e é isso que acaba por prevalecer e canalizar tudo para os seus objetivos reacionários. Assim, o paradoxo dos que se manifestaram na segunda-feira, 29 de agosto, é o fato de terem depositado a sua confiança naqueles que também irão governar contra os interesses das grandes maiorias populares e da classe trabalhadora.
Bem diferente foi o comício na tarde de terça-feira, 30 de julho, por María Corina Machado e Edmundo González, na zona leste mais abastada da cidade, tradicional reduto deste setor político, do que se viveu na segunda-feira, 29 de julho, nas zonas populares. A mesma situação com a marcha que ocorreu neste sábado, 3 de agosto, convocada por esta mesma oposição política em suas zonas tradicionais de controle, que o fez mais para medir forças e perseguir seus objetivos políticos reacionários com a demagogia da bandeira democrática, que estavam longe de qualquer foco de repressão como o sofrido pelos setores populares em 29J. No mesmo dia em que o governo de Maduro também convocou em Caracas para tentar consolidar sua fraude eleitoral sustentada com repressão militar, policial e para-policial.
Em ambas as marchas e comícios, com as demagogias dos seus setores políticos dirigentes, em que nós, que nos denominamos anti-capitalistas e socialistas, não chamamos a participar. Duas demagogias em curso foram expressas, por um lado, a do governo que tenta manter-se através da repressão, acenando com o fantasma do imperialismo, mas que é ajustador e repressor e, por outro lado, a direita pró-imperialista que tem sido historicamente caracterizada pelo seu golpismo que toma a bandeira democrática, mas que apelou à intervenção militar no país, para que as Forças Armadas levassem a cabo um golpe militar, ao mesmo tempo que eram os incentivadores das sanções dos Estados Unidos e das potências europeias.
A crise política ainda está aberta e ainda não está claro como sair dela, mas todos os cenários tanto da direita como do governo de Maduro, nenhum deles é favorável para o povo trabalhador, por isso uma alternativa é a necessidade de lutar por um pólo independente de Maduro, da direita e do imperialismo.
Um governo reacionário e autoritário como o de Maduro e das Forças Armadas, com as suas políticas brutalmente anti-trabalhadores, empurra os trabalhadores e os setores populares para os partidos da direita tradicional pró-imperialista, sendo a única alternativa visível, na ausência de forças visíveis de organizações de trabalhadores que expressem os interesses dos trabalhadores e dos setores populares. Dizemos isto porque os planos econômicos de María Corina e Edmundo González também visam privilegiar os lucros dos negócios, o grande capital e os interesses dos ricos, acima de qualquer outro interesse ou direito dos trabalhadores e do povo.
Um governo entreguista e repressivo e uma direita pró-imperialista, ambos inimigos dos trabalhadores.
Os trabalhadores e o povo venezuelano estão confrontados com dois grandes inimigos dos seus interesses que lutam pelo poder. Um governo acomodado com a repressão que certamente dará um salto se acabar se mantendo, que mantém grandes negócios com as transnacionais imperialistas e está disposto a continuar negociando a dívida e até mesmo a voltar ao FMI para obter financiamento internacional, realizando um dos mais terríveis planos capitalistas contra os trabalhadores. Na retaguarda, uma direita pró-imperialista liderada, desta vez, por María Corina Machado, trumpista e admiradora dos planos de Milei e da direita internacional - sublinhando, inclusive, em pleno genocídio, o seu alinhamento com Israel -, servidora do imperialismo até a alma, que saudou o intervencionismo, as sanções e até a intervenção militar. Um governo Trumpista, pró-imperialista e de direita, que mesmo com a legitimação dos votos, será também um dos governos mais anti-trabalhadores e entreguistas. Ambos são responsáveis pela tragédia que o país está vivendo.
Desde que o governo de Maduro tomou decisões econômicas e políticas de grandes consequências, que não só implicaram o aprofundamento de severos ajustes contra as amplas maiorias da população trabalhadora que foram acompanhados pelas forças do poder econômico empresarial e capitalista de todos os matizes, mas com todo um percurso de entreguismo e uma dolarização de fato da economia, com a livre circulação do dólar funcionando como mais uma moeda nos circuitos econômicos, onde os empresários fixam os preços a nível internacional. Maduro chegou a dizer que quer voltar ao FMI para obter financiamento e pagar uma dívida externa avaliada em 160 bilhões de dólares; recordemos que só entre 2014 e 2017 pagou mais de 74 bilhões de dólares, mergulhando o país numa grande miséria, e não pagou mais porque as sanções fecharam as portas ao financiamento externo e, portanto, à reestruturação da dívida.
Sob Maduro tem havido um processo crescente de privatização, alterações na Lei dos Hidrocarbonetos, Lei do Investimento Estrangeiro, exploração predatória do Arco Mineiro, entre outras medidas importantes, que têm vindo a permitir que setores controlados pelo Estado sejam progressivamente transferidos para empresas estrangeiras ou grupos econômicos locais, como se pode ver muito claramente na área do petróleo, onde empresas norte-americanas, europeias, russas, chinesas e de outras latitudes estão avançando nos seus controles. A Chevron, só para mencionar a empresa simbólica do imperialismo, está fazendo grandes negócios na Venezuela, para não falar da russa Rosneft e da estatal chinesa CNPC, que começaram assumindo o controle dos principais campos petrolíferos da Venezuela. O grande capital internacional, sem distinção, está ficando com este grande saque. Um negócio em que também há grandes empresários locais, como Oswaldo Cisneros, para dar apenas um exemplo, que estão assumindo o controle de importantes empresas petrolíferas que estavam sob o controle do Estado com uma participação majoritária.
Por outro lado, temos esse setor pró-imperialista, como seus agentes mais diretos, que têm defendido que neste país tudo deve ser privatizado, como María Corina Machado expressou abertamente. Apesar de estarmos perante um governo amplamente repudiado pela maioria da população, a política do setor mais duro da direita venezuelana é a mesma que levantaram em 2019, para entregar o que chamam de "soberania popular" do povo venezuelano a Washington. Porque, no final das contas, o que eles estavam procurando durante a ofensiva golpista de 2019 foi orquestrado pelo governo de Donald Trump para que eles estivessem no governo em Caracas e impusessem seus projetos. Vêm também para a rendição, como disse abertamente María Corina, e outros ataques contra o povo, tal como expresso no plano "Tierra de gracia" (um nome que alude às riquezas a serem saqueadas), e que será alinhado com os Estados Unidos e ainda mais com a provável chegada de Trump à Casa Branca. Embora possa haver diferenças, como certamente se pode ver em relação à principal empresa petrolífera PDVSA, onde María Corina propõe privatizá-la na sua totalidade, e o governo de Maduro tem vindo a aplicar um plano para geri-la de forma capitalista juntamente com as Forças Armadas, mantendo-se em muitas das joint ventures como parceiro júnior (revertendo a Lei dos Hidrocarbonetos). Embora, e é importante notar, que eles avançariam pelo caminho traçado por Maduro, que fez muito desse trabalho reacionário em favor do capital privado.
É por isso que é necessário repudiar ambos os lados e não cair nos enganos daqueles que agora se pintam como "democratas", ou daqueles que se colocam miseravelmente na calçada de Maduro. Repudiar e enfrentar tanto o governo quanto a direita pró-imperialista, neste momento, é defender os interesses dos trabalhadores, sem deixar de ser pelo direito elementar do povo de conhecer os resultados concretos. É elementar para qualquer anti-imperialista repudiar as sanções imperialistas que foram aplicadas à Venezuela desde agosto de 2017 e que se agravaram em 2019 no setor petrolífero, o confisco de ativos offshore, alguns deles avaliados em cerca de 13 bilhões de dólares como a empresa Citgo.
A Venezuela na política dos EUA, Rússia, China e o papel do Brasil
É fundamental considerar o lugar da Venezuela na disputa entre EUA, China e Rússia quando novos ventos políticos sopram com cenários abertos num mundo mais convulsivo.
Os interesses dos Estados Unidos se movem na nova conjuntura internacional buscando garantir para si um aliado e subordinado leal na Venezuela, e não ter que estar permanentemente negociando com Maduro como vem fazendo com reuniões e negociações às escuras após a tentativa fracassada de golpe de 2019 com Juan Guaidó, buscando garantir alternativas petrolíferas numa chave mais estratégica, dado o clima militarista nas potências, bem como para suas grandes corporações como a Chevron e outras corporações norte-americanas que realizam grandes negócios no país.
O atual governo de Maduro tem uma história que deriva de um chavismo que na altura tinha surgido com traços bonapartistas sui generis, virado à esquerda com Chávez, com algumas fricções com o imperialismo norte-americano, que levaram a tentativas de golpes como o de 2002, bloqueios petrolíferos, etc., mas que não alteraram a estrutura semicolonial capitalista e dependente do país. Mas quando o ciclo económico da bonança petrolífera se alterou, entrou em crise e decadência, tornando-se cada vez mais repressivo e submisso, chegando à fase atual.
Um governo mais alinhado com a política imperialista na região é o desejo almejado pelos Estados Unidos de somar mais um aliado, ainda mais diante do possível retorno de Trump à presidência, como seria com uma María Corina mais trumpista, como também é o presidente Milei da Argentina, além de alinhado com a linha que a OTAN está tomando na Europa com a atual guerra na Ucrânia e com a política no Oriente Médio, como María Corina Machado tem afirmado publicamente. Era, pois, uma questão de tempo até que os Estados Unidos anunciassem o reconhecimento de Edmundo González como vencedor das eleições, reforçando toda a direita continental, que desde as primeiras horas do ato eleitoral aclamou González Urrutia como o vencedor das eleições.
Mas há também interesses da Rússia, enquanto grande potência militar, na Venezuela, quando esta se encontra no meio de uma guerra às portas da Europa, com a OTAN atuando como representante do lado ucraniano. Foi por isso que a Rússia reconheceu a vitória fraudulenta de Maduro e apoiou a repressão. Se Maduro, que agora começou a chamar ao seu governo um governo civil-militar-policial, se instalar, e com uns Estados Unidos mais conflituosos, terá de se alinhar muito mais com a Rússia, gerando uma tensão regional permanente, pois não esqueçamos que Maduro se alinhou com Putin na guerra que este está travando com a Ucrânia, o que pode gerar mais instabilidade política na região. Já para não falar da China, que também reconheceu Maduro, dados os grandes interesses económicos do país asiático na Venezuela, sendo considerado um aliado estratégico, com fortes investimentos no setor petrolífero e noutras áreas econômicas importantes.
Nesse cenário, o setor menos trumpista do nosso continente e não alinhado com a Rússia, como Brasil, México e Colômbia, buscam a cartada da mediação, exigindo o que chamam de "verificação imparcial" no acordo entre Maduro e Edmundo González (María Corina Machado), que nada mais é do que pactos e entendimentos de cima para baixo, que não podem ser outra coisa, baseados em seus interesses e alheios aos do povo. É por isso que o Brasil, como principal ator regional e diferenciado da direita continental, mantém diálogo com Maduro e González Urrutia, fazendo ponte também com os Estados Unidos, além da articulação com outros países da região. Não é por acaso que este país assumiu a custódia das embaixadas do Peru e da Argentina em Caracas devido à tensão com estes países e à expulsão de todo o seu pessoal diplomático, uma ação que não poderia ser levada a cabo sem a aprovação de Maduro. O que está em jogo é, portanto, o destino da Venezuela, não só na região, mas também no tabuleiro de xadrez internacional.
Uma posição independente da esquerda anticapitalista e socialista.
Na nossa declaração de terça-feira 30J, afirmamos que o povo tem o direito de conhecer os resultados, que as atas sejam publicadas, mesa por mesa, denunciando a brutal repressão levada a cabo pelo governo de Maduro, que na segunda e terça-feira se concentrou nos setores populares, diferenciando-nos da direita imperialista que quer capitalizar para os seus próprios interesses, alheios aos da classe trabalhadora e das grandes maiorias populares, denunciando frontalmente o setor de María Corina de Machado. Defendemos frente a fraude, que se dê acesso, como deve ser, a todos os dados, e que se publiquem as atas. Mas agora a chave, como dissemos acima, é lutar para constituir um pólo independente de Maduro, da direita e do imperialismo.
Nesta situação, e já na sua fase de decomposição e decadência em que o chavismo caiu, surgiram setores que subscreveram todas as políticas do governo de Maduro, apoiando abertamente a fraude em curso, alguns com argumentos brutalmente antidemocráticos, como a negação do direito do povo a conhecer os resultados, e apoiando assim na prática a repressão violenta. Dizemos claramente não à repressão deste governo anti-trabalhador e anti-popular e pela libertação dos detidos. Advertimos os setores populares que se mobilizaram na segunda-feira que a oposição pró-imperialista com María Corina Machado à cabeça os utilizará como base de manobra para as suas negociações e os seus pactos a partir de cima, para arrastá-los com a sua importante base histórica tradicional (classe média de direita para cima) que se aproxima dos seus objetivos.
Desde antes das eleições, aqueles que, entre nós, se reivindicam da esquerda anticapitalista e socialista têm levantado uma política de independência de classe. Perante a impossibilidade de lançar uma candidatura devido às proibições, propusemos a outras organizações que se afirmam como organizações de trabalhadores e socialistas que fizessem uma grande campanha unida a partir da classe trabalhadora e que tivessem uma política ativa. Juntamente com os camaradas do Partido Socialismo e Liberdade, da Marea Socialista, do PPT-APR e da Liga de Trabalhadores pelo Socialismo, levantámos a palavra de ordem "A classe trabalhadora não tem candidato" para enfrentar ambos os lados dos patrões, tanto o governo como a oposição pró-imperialista e os outros partidos da oposição, com a formulação da questão do voto, apelando ao voto nulo. Fizemos isso porque entre todos os candidatos reina um consenso capitalista como saída para a crise do país, ou pelo de conciliação, em que "juntos trabalhadores e empresários" levarão a Venezuela "para frente".
Articulamos um programa anti-capitalista no sentido de que os trabalhadores devem governar, um governo dos trabalhadores em ruptura com o capitalismo. Para além de apelar à maior unidade para enfrentar a grande repressão que estamos sofrendo, denunciando também a ingerência imperialista e contra as sanções, bem como levantando bandeiras econômicas, sociais e democráticas como a liberdade dos trabalhadores presos, etc. Consideramos que foi uma campanha importante porque permitiu, pelo menos em pequenas franjas que questionam Maduro e são relutantes a María Corina Machado, mostrar outras perspectivas em eleições desenhadas sob um esquema completamente fraudulento.
Consideramos que só com a mobilização operária e popular de forma independente poderemos lutar pelos plenos direitos democráticos do povo e da classe trabalhadora, bem como por melhores condições de vida, pela liberdade dos trabalhadores presos, contra as medidas de austeridade e as tarifas, a partir de qualquer um dos grandes fatores em conflito, unindo os setores que lutam no quadro de uma perspetiva própria dos trabalhadores.
Mas propomos que, diante de uma situação em que também começa a se desenvolver uma reconfiguração de forças no atual cenário político em chave frentista e populista, propusemos àqueles que impulsionamos a campanha unitária no período pré-eleitoral discutir como colocar de pé uma esquerda anticapitalista e socialista a partir da classe trabalhadora. Esse é o grande desafio que temos atualmente, na perspectiva da construção de um partido revolucionário anticapitalista enfrentando todas as variantes patronais.
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